quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Mais um Delírio




Não tenho sono nem dono,
não sinto a dor, não vejo a flor.

Vou mergulhar fundo,
até não respirar
e só vou acordar
quando a tua mão encontrar.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Não pense

Está aberto o festival do besteirol. Nessa época de final de ano o que mais se vê/lê/assiste são notícias relacionadas a celebridades e sub celebridades. E não estou falando de notícias sobre o que essas pessoas estão fazendo para ajudar o coletivo, mas sim quem namora quem, quem levou o pé, qual a gostosa da moda, que tipo de roupa fulana vai usar nas festas e por aí vai. O que é realmente importante saber, fica escondido numa caixinha até o final das férias de verão. A partir de agora ninguém mais quer saber sobre o custo de vida, corrupção, violência, mazelas do mundo e tudo o que possa representar problemas que se transformem em rugas. Ninguém quer ver/ler/assistir nada disso.

O Natal está aí, depois o Ano Novo e enfim as férias. Claro, logo depois o Carnaval. Vamos todos jogar fora as máscaras que nos aprisionaram o ano inteiro e aproveitar a liberdade de não pensar/fazer nada até março quando tudo volta ao normal e um novo disfarce precisa ser escolhido. É possível até usar a máscara de palhaço usada no carnaval.  


segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

O chapéu

Sentado, dedo em riste, o velho tropeiro discute com a Morte. Ela veio buscá-lo, mas ele crê que ainda não é sua hora. Chove fininho e o ar começa a ficar gélido. Lelé, abanando o rabo, percebe a presença daquela que assombra os sonhos de seu protetor. Soberana, de manto negro e foice em punho, espera calada. Já conhece todas as artimanhas dos vivos e sabe que ninguém consegue enganá-la. Irritado com a indiferença, o velho Amaral levanta, dá dois passos e cai. A mão enrugada tenta um último movimento: alcançar o chápeu caído a sua frente. Porém, acaba ali o derradeiro sopro de vida. Seu companheiro uiva, abocanha o chapéu e sai correndo.

Ainda confuso, o pequeno Amaral senta na cama e suspira:
- Ah Lelé, que bom, foi só um pesadelo. Que foi? Você tá triste?
O cachorro apenas lhe entrega o velho chapéu.  


terça-feira, 29 de novembro de 2011

À Espera


De tempos em tempos era assim. Quando a chuva caia, se entregava às gotas refrescantes e sedutoras. Até a alma, Marina sentia-se purificada e abençoada. Depois continuava o ritual. Envolta em véus, descia lentamente as escadas até alcançar o penúltimo degrau para acordar horas mais tarde sem saber o que havia acontecido.

Aquilo tudo não entendia, mas também não contestava. Aprendera com o tempo... seguia os dias esperando a próxima chuva.



domingo, 13 de novembro de 2011

O jogo


— Par.
— Ímpar.
— Par, ahá, ganhei.
— Droga, tu sempre ganha.
— Sempre não, na segunda tu ganhou.
— E agora o que vou fazer? Hoje só tem isso.
— Tá vendo? Na segunda tinha dois... e dá pra fazer um monte de coisa com a tua parte.
— Não dá, a tua é melhor. Vamô trocá?
— Não senhora, jogo é jogo. Eu também quero o que ganhei, já tô até imaginando o que vou fazer, huummm!!
— Só hoje, não peço nunca mais, juro.
— Não. E não adianta fazer essa cara de choro. Só porque é menor que eu acha que sempre pode ficar com a melhor parte. Jogo é jogo, tu tem que entender. Ainda bem que hoje ganhamos esse ovo. Ah, que coisa. Tá bom. Fica com a clara que eu fico com a gema.  


quinta-feira, 13 de outubro de 2011

domingo, 10 de abril de 2011

A escola do meu filho não leva os alunos à Feira do Livro de Porto Alegre

Cheguei a triste conclusão: as escolas particulares, e isso incluem as escolas infantis, não querem e não gostam de levar os alunos à Feira do Livro de Porto Alegre. Meu filho, hoje na 4ª série do Ensino Fundamental nunca, afirmo categoricamente, nunca foi com nenhuma instituição de ensino, visitar a Feira do Livro.Justificativa eles tem de sobra, todas infundadas. As escolas privadas, isso inclui professores, quadro pedagógico e supervisão, não querem ter o trabalho de cuidar das crianças no evento. Não querem sair da sua zona de conforto. Essa era a minha opinião até o início do ano letivo.

No primeiro contato com a nova professora do meu filho, na reunião com os pais, fiz a pergunta: “as crianças vão à Feira do Livro?”. A resposta foi o tradicional não. Insisti, afinal sempre questiono os motivos dessa resistência. Então, a conversa, quase num tom de discussão, ficou na fronteira entre o real e o insano.

- A Feira é muito perigosa, - disse a professora.
- Como assim? – pergunto
- É muita gente, são muitas crianças para cuidar.
- Sim, mas a Área Infantil tem agendamento para as escolas na parte da manhã, – insisto.
- Não é nosso horário de aula e é perigoso também porque fica na beira do rio.
- Mas nesse caso poderia ser uma exceção e o espaço é todo gradeado. Ou até mesmo na parte da tarde, o local é bem seguro. Depois as crianças podem trabalhar o livro de um autor e ir assisti-lo, pegar autógrafo...  
- A escola não tem interesse, já temos um projeto parecido. Depois, eles vão querer comprar livros.
- Claro que eles vão comprar livros, esse é o objetivo!! Mas também podem assistir as atrações culturais.
- As apresentações são de baixa qualidade, os alunos não vão aproveitar. E nesse tipo de evento, sabe como é, misturam alunos de tudo quanto é escola, isso não é legal para eles.
Diante das respostas da professora de 4ª série de escola particular, não me restou mais argumento, porque o próximo passo nos levaria à diretoria.
A escola do meu filho não leva os alunos à Feira do Livro de Porto Alegre porque a Feira é muito perigosa, uma criança pode ser esmagada na multidão, ou pior, cair no rio. Isso significa que nenhuma outra escola leva suas crianças lá. Pais preocupadíssimos deixam os filhos em casa com medo da fúria dos leitores ávidos pelas novidades literárias.
A escola do meu filho não leva os alunos à Feira do Livro de Porto Alegre porque, imagina, eles vão querer comprar livros!! Onde já se viu? Deveria ser proibida a venda de livros para crianças.
A escola do meu filho não leva os alunos à Feira do Livro de Porto Alegre porque as apresentações não tem qualidade. Claro, a professora é especialista em arte formada em Harvard e os projetos culturais da escola sempre vão além da Festa Junina e das outras datas comemorativas.
A escola do meu filho não leva os alunos à Feira do Livro de Porto Alegre porque na Feira vão crianças de tudo quanto é escola. Obviamente os alunos do colégio particular que o meu filho frequenta, não podem se misturar com os alunos das escolas municipais ou estaduais. Meu Deus, e se eles ficarem no mesmo espaço de crianças de uma escola de vila? Sentados lado a lado, maravilhados com o teatro, com a contação de histórias, com os personagens do livro recém comprado? A professora só poderia identificar o meu filho pelo uniforme. E isso deve apavorá-la.
E assim, a escola do meu filho não leva os alunos à Feira do Livro de Porto Alegre.

O ponto da resistência

Ela tentava explicar a todo custo o pavor pela coisa, a distância do tempo e a incongruência dos fatos, mas ele não se dava por satisfeito. Nem mesmo o falso argumento de algum trauma provocado na infância era suficiente para desfazer a ideia fixa de Renato. Ele queria e ponto. Era assim desde pequeno, ela sabia.
Marisa, apreensiva com a situação, gesticulava como se a energia gerada naquele pequeno espaço entre as duas mãos pudesse transportá-la para um mundo paralelo. Ele continuava ali, imóvel, impassível. Ela gesticulando cada vez menos, rogava forças para resistir.
Resistiu, resistiu... resistiu. Renato queria e ponto.   

sexta-feira, 8 de abril de 2011

El mistério de la lectura


"El amor por la lectura es algo que se aprende pero no se enseña. De la misma forma que nadie puede obligarnos a enamorarnos, nadie puede obligarnos a amar un libro. Son cosas que ocurren por razones misteriosas, pero de lo que sí estoy convencido es que a cada uno de nosotros hay un libro que nos espera. En algún lugar de la biblioteca hay una página que ha sido escrita para nosotros".
Alberto Manguel

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

O Leitor de Borges


Os livros despertam a imaginação... você não está cansado de ler isto? Eu já li essa frase milhares de vezes e entendi o recado na primeira. Mas parece que muitos ainda não. Ela é simples, quer dizer o que está dizendo.

A leitura é uma das poucas coisas que podemos fazer sozinhos sem estarmos sós. São personagens que nos acompanham, nos fazem rir e chorar. Cenários que não saem da nossa cabeça. Mas nos sentimos assim apenas diante de um bom livro. E são esses bons livros que ficam marcados na memória.

Para quem gosta de ler e tem sede de conhecimento indico “Uma História da Leitura”, de Alberto Manguel. A obra de 400 páginas (se você é leitor mesmo não vai se assustar) é uma verdadeira enciclopédia sobre leitores, leituras e livros. É um passeio sobre como surgiu a escrita, os primeiros leitores, a leitura silenciosa (antes era apenas em voz alta), as formas de livros, o roubo de livros, os copistas, as leituras proibidas, a Bíblia de Gutenberg e muito mais.

Li este livro há 6 anos. Não conhecia o autor, mas ele acabou me conquistando. Manguel é argentino naturalizado canadense. Não é conhecido do grande público porque a maioria de seus livros são ensaios. Quando o indico para alguém a maior referência sobre ele é esta: Manguel foi um “leitor” de Borges. Essa experiência também está em “Uma História da Leitura”. Não preciso dizer mais nada.    

Ah... ia esquecendo. Ele lançou um romance em 2010, “Todos os homens são mentirosos” e estará na Jornada Literária de Passo Fundo, em agosto.


quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

O Pecado - A Inveja


Dante Alighieri, em A Divina Comédia, coloca a Inveja como um pecado não tão pecaminoso assim. Dividida em três partes, Inferno, Purgatório e Paraíso, a obra de Dante traz os 7 Pecados Capitais dispersos entre o Inferno e o Purgatório. A Inveja, não está nos círculos do Inferno, onde ficam os piores pecados como a Ira e a Luxúria.

O Purgatório é o lugar reservado para as almas dos invejosos. Estes, durante a passagem pela vida terrena, cobiçaram um lenço, um marido, uma posição social ou até mesmo um simples caminhar. Nada escapava a inveja das almas que agora tentavam purgar suas culpas. Invejar, invejar e invejar! Nada mais importava, nada mais lhes dava tanto prazer na vida.

Castigo para os pecadores? Sim. Dante escreveu que a punição para as almas dos invejosos era nada mais ver. Pálpebras costuradas nos olhos por fios de metal. Como invejar agora se toda a consumação desse pecado vem da visão? E você, qual a sua inveja?

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Matemática pura e simples



O que é uma vida a não ser um montante de fatos, acontecimentos e lembranças ao final dela? Uma vida vivida, dizem por aí. Certo, algumas felizes, esplendorosamente felizes, outras nem tanto. E quando sentamos para fazer as contas do que foi bom ou ruim, percebemos que ainda falta. Sim, ainda falta vida.

Essas contas eu faço desde agora. Somo, diminuo, às vezes multiplico e diminuo de novo. Sei que a vida é essa. Fui aprendendo ao longo do caminho. Felicidade? A conta gotas. Diminuo, somo, somo, multiplico e divido.

Não espero uma vida longa. Não, não é medo de ficar velha, flácida, com rugas e tudo mais. É vontade de entender, de saber, de conhecer (quanto verbo). Vontade de nascer do outro lado. Lembrar o que esqueci, saber o que desaprendi. Talvez, confesso, curiosidade. E não foi a curiosidade que me trouxe até aqui? Seja o que for, quando for, irei feliz. Afinal, é para isso que vivemos.